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NINGUÉM VAI LER

Metáforas da vida real escritas em poucas palavras a alguém que: sempre lê.

´Ninguém Vai Ler´ é um projeto pessoal de produção de poesias e de crônicas de um coração nômade. São textos soltos que, no entanto, prendem rapidamente a atenção do leitor e por isso o trocadilho da expressão, pois todo mundo lê.

onde você namora?

essas foi a pergunta mais sensata que me fizeram esses dias, citando uma fala de alceu valença, que um dia disse não morar, mas namorar vários lugares.

eu moro em lugar algum, e pertenço a todos eles. uma vez arrancada da raíz, me carregue num potinho com água pra eu ser replantada. raíz rasa, mais fácil de arrancar e plantar em outro solo - mas tem que ser fértil.

todos os lugares fizeram-se lar, as pessoas, amigas. muitos amores: desamores.

quando me perguntam onde eu moro, eu já não sei responder. mas eu namoro a bahia, me enamorei no rio, flerto são paulo, tive um relacionamento aberto com lisboa, nova york é o amor da minha vida e tô dando um tempo com brasília.

me chamem de namoradeira, porque eu sou mesmo.

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sentir-se

casa é onde meu coração mora. às vezes, nela, tem roupa de cama limpa e comida fresca. às vezes, é um refúgio improvisado com uma mala de canto. às vezes, tem ar-condicionado; muitas vezes, passa calor também. às vezes, tem gente nova pra habitá-la. todas as vezes, tem amigos - não existe casa sem amigos. a família, a gente carrega na mala pra habitar sempre uma nova casa. tem dia que tem conforto, tem dia que tem barulho, mesmo quando você quer o silêncio. tem dia que tem só eu, muitos dias. casa é onde eu possa me sentir: em casa.

sangue mineiro
alma carioca
coração baiano

me fizeram filha do cerrado, mas meu pé foi feito pra caminhar na areia. sou filha de oxum, mas escolhi também ser filha do sol. meu corpo pede sal, sol, suor. minha alma se alimenta de gente, de rua, de calor. fiz do mar meu quintal, do litoral meu abrigo. do Rio minha casa, da Bahia meu refúgio. me embebedei da lavagem do bonfim, da luz do portinho, da história do pelourinho, da boemia do rio vermelho e das águas de yemanjá. meu sangue é mineiro. minha alma é carioca, meu coração: baiano

passado presente futuro

amar

no infinitivo

é amar

sem conjugação

amou

no passado

foi perfeito

amara

nem presente

nem futuro

mas mais que perfeito

amado

um amor participado

amando

aqui

agora

no futuro

amarás?

livre pra se sentir livre

bethânia tá certa quando diz que eu não ando só. até ando. ando livre, não só. liberdade é poesia de encontro: comigo, com você, com ele que foi passageiro, com ela que sei que vai ficar.

liberdade me leva longe, com quem quero, pra onde quero, se quero. tem dia que a liberdade anda acompanhada, tem dia que ela esbarra com você na rua e vai embora, tem dia que ela marca hora pra te encontrar e fica. e tem dia que ela anda sozinha. muitos dias.

tem dia que liberdade se confunde com solidão. e fica ali, quieta, de canto, quietinha. tem dia também que liberdade se mistura com euforia. e grita. mas até nisso a liberdade é livre.

parede de memórias

é fácil concordar com Carlos Drummond quando ele diz que “a vida necessita de pausas”. parece ser difícil viver esse clichê depois da euforia instaurada nessa beleza que é a liberdade de multiplicar-se em lugares. 

a delícia e a dor de fechar o último zíper da mala e falar “acho que não tô esquecendo nada”. não dá pra esquecer da primeira cerveja tomada com um desconhecido em Trancoso que, nesse mesmo dia, te convidou a morar com ele - e você foi. e voltar foi ficando cada vez mais difícil.

a mala vai ficando pesada. nela, tem de caber muita coisa com muita gente com muito sol e algumas pausas pra lua cheia com muito samba e forró com algumas tentativas de amar e também alguns (desa)mares. isso tudo com muitos biquínis e pouca roupa, pra balancear o peso dessa bagagem.

tem coisa que não cabe na mala mesmo e a gente deixa pra trás - bem pouca, na verdade. o viajante faz muita coisa valer a pena pra que quase tudo caiba ali dentro. 

mas chega uma hora que a bagagem enche e você não tem mais braços e costas pra aguentar o peso - e começa a repensar se vale a pena carregar bagagem extra. é quando você volta ao seu lugar de partida,  descarrega, acha um canto especial na sua casa pra caber tudo o que trouxe na mala, mesmo sabendo que algumas dessas memórias desbotarão na sua parede ao longo do tempo.

todo pássaro precisa de um pouso pra alçar o próximo voo. nos vemos na próxima estação!

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caminhar em metáforas

fechar a porta de casa, tocar o pé na grama, atravessar a terra quente, alcançar a areia, deixar a água do mar bater. “pra onde vamos?”. essa é a pergunta que você faz consigo mesma no início de cada novo percurso, mesmo sabendo que você está sozinha, porque não existe “nós”. e você prefere sozinha.

você irá cruzar com alguns passantes no início da caminhada. o início é gostoso, seu pulmão tá cheio, seu corpo tá descansado e sua mente tá relaxada. mas eles são passantes; seus caminhos se cruzam por algum tempo, vocês sorriem um para o outro e cada um segue o seu rumo.

você tá sozinha. e você prefere sozinha. a quantidade de pessoas e sorrisos diminuem ao longo do percurso. mas você não se importa, porque você tá cada vez mais longe. e mais sozinha.

você então começa a correr, porque tem fôlego - e pernas - para correr. vez ou outra você olha pra trás, mas você sabe que ninguém mais vai te ver. e você mira pra frente, mesmo sabendo que ninguém quer te esperar.

tem hora que o ar parece não querer mais entrar no seu corpo. mas você corre. e quando você percebe que não tem mais ninguém, é ali que você quer estar. você prefere sozinha. e você chegou até ali sozinha.

no mar. sozinha. amar

 tava ali filmando a vida com meus próprios olhos e pensando no roteiro desse filme. na verdade, é uma série e acabou mais uma temporada. começou bem, começou leve. mas ficou densa, ficou pesada; os diálogos parecem ter sido trocados pelos monólogos de mais um coadjuvante sem talento pra atuar nessa obra impecável - e rapidamente foi cortado da série. parte do elenco principal permanece, sem eles não tem enredo; alguns fizeram apenas participações especiais - outros, nem tão especiais assim. os novos atores da próxima temporada talvez já estejam ensaiando suas atuações para os episódios que virão. quantas temporadas mais pra essa série chamada vida?

próxima temporada

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